Empresa planeja usar a Terra como um reator químico

Esqueça os enormes tanques de aço – alguns cientistas querem fabricar produtos químicos com a ajuda de rochas nas profundezas da superfície da Terra.

Uma nova pesquisa mostra que a amônia, um produto químico essencial para fertilizantes, pode ser produzida a partir de rochas a temperaturas e pressões comuns abaixo da superfície. A pesquisa foi publicada hoje na Joule, e a MIT Technology Review pode informar com exclusividade que uma nova empresa, chamada Addis Energy, foi fundada para comercializar o processo.

A amônia é usada na maioria dos fertilizantes e é uma parte vital do nosso sistema alimentar moderno. Ela também pode ser aplicada enquanto combustível verde em setores como o de transporte marítimo transoceânico. O problema é que os processos atuais usados para produzir amônia requerem muita energia e produzem grandes quantidades de gases de efeito estufa que causam mudanças climáticas – mais de 1% do total global. O novo estudo descobriu que as condições internas do planeta podem ser usadas para produzir amônia em um processo muito mais limpo.

“A Terra pode ser uma fábrica de produção química”, diz Iwnetim Abate, professor do MIT e autor do novo estudo.

Essa ideia pode representar uma grande mudança para o setor químico, que atualmente depende de enormes instalações que executam reações a temperaturas e pressões extremamente altas para produzir amônia.

Os principais ingredientes para a geração de amônia são fontes de nitrogênio e hidrogênio. Atualmente, grande parte do foco em métodos de produção mais limpos está em encontrar novas maneiras de produzir hidrogênio, uma vez que esse produto químico representa a maior parte da pegada climática da amônia, diz Patrick Molloy, diretor da agência de pesquisa sem fins lucrativos Rocky Mountain Institute.

Recentemente, pesquisadores e empresas localizaram depósitos naturais de hidrogênio no subsolo. As rochas ricas em ferro tendem a conduzir reações que produzem o gás, e esses depósitos naturais poderiam fornecer uma fonte de hidrogênio de baixo custo e baixas emissões.

Embora o hidrogênio geológico ainda esteja em sua infância como indústria, alguns pesquisadores esperam ajudar o processo estimulando a fabricação no subsolo. Com as rochas certas, calor e um catalisador, é possível produzir o gás de forma barata e sem emitir grandes quantidades de poluição climática.

No entanto, o hidrogênio pode ser difícil de ser transportado. Nesse sentido, Abate estava interessado em dar um passo adiante, deixando que as condições subterrâneas fizessem o trabalho pesado de alimentar as reações químicas que transformam o hidrogênio e o nitrogênio em amônia. “Ao cavar, você obtém calor e pressão de graça”, diz ele.

Para testar como isso poderia funcionar, Abate e sua equipe trituraram minerais ricos em ferro e adicionaram nitratos (uma fonte de nitrogênio), água (uma fonte de hidrogênio) e um catalisador para ajudar nas reações em um pequeno reator no laboratório. Eles descobriram que, mesmo em temperaturas e pressões relativamente baixas, conseguiam produzir amônia em questão de horas. Se o processo fosse ampliado, estimam os pesquisadores, um poço poderia produzir 40.000 quilos de amônia por dia.

Embora as reações tendam a ser mais rápidas em alta temperatura e pressão, os pesquisadores descobriram que a produção de amônia poderia ser um processo economicamente viável mesmo a 130 °C (266 °F) e a pouco mais de duas atmosferas de pressão. Essas condições seriam acessíveis em profundidades alcançáveis com a tecnologia de perfuração existente.

Mesmo com o fato que as reações funcionam em laboratório, ainda há muito trabalho a ser feito para determinar se, e como, o processo pode realmente acontecer em campo. Uma coisa que a equipe precisará descobrir é como manter as reações em andamento, pois na reação que forma a amônia, a superfície das rochas ricas em ferro será oxidada, deixando-as em um estado em que não podem continuar reagindo. Mas Abate diz que a equipe está trabalhando para controlar a espessura da camada de rocha inutilizável e sua composição, para que as reações químicas possam continuar.

Para comercializar esse trabalho, Abate está cofundando uma empresa chamada Addis Energy com US$ 4,25 milhões em fundos pré-semente de investidores, incluindo a Engine Ventures. Entre seus cofundadores estão Michael Alexander e Charlie Mitchell (que já trabalharam no setor de petróleo e gás) e Yet-Ming Chiang, professor do MIT e empreendedor em série. A empresa trabalhará no aumento da escala da pesquisa, incluindo a busca de locais potenciais com condições geológicas para produzir amônia no subsolo.

A boa notícia para os esforços de aumento de escala é que grande parte da tecnologia necessária já existe nas operações de petróleo e gás, diz Alexander, CEO da Addis. Um sistema implantado em campo envolverá perfuração, bombeamento de fluido para o solo e extração de outros fluidos abaixo da superfície, todas operações muito comuns nesse setor. “Há uma química nova que está envolvida em um pacote de petróleo e gás”, diz ele.

A equipe também trabalhará no refinamento das estimativas de custo do processo e na obtenção de um melhor entendimento da segurança e da sustentabilidade, diz Abate. A amônia é um produto químico industrial tóxico, mas é comum o suficiente para que haja procedimentos estabelecidos para manuseio, armazenamento e transporte, diz Molloy, da RMI.

A julgar pelas estimativas iniciais dos pesquisadores, a amônia produzida com esse método poderia custar até US$ 0,55 por quilograma. Isso é mais do que a amônia produzida com combustíveis fósseis atualmente (US$ 0,40/kg), mas a técnica provavelmente seria mais barata do que outros métodos com baixas emissões. Ajustes no processo, incluindo o uso de nitrogênio do ar em vez de nitratos, poderiam ajudar a reduzir ainda mais os custos, chegando a US$ 0,20/kg.

Novas abordagens para a fabricação de amônia podem ser cruciais para os esforços climáticos. “É um produto químico essencial para o nosso modo de vida”, diz Karthish Manthiram, professor da Caltech que estuda eletroquímica, incluindo métodos alternativos de geração de amônia.

A pesquisa da equipe parece ter sido projetada com a escalabilidade em mente desde o início. Além disso, usar a própria Terra como um reator é o tipo de pensamento necessário para acelerar a jornada de longo prazo da produção química sustentável, acrescenta Manthiram.

Enquanto a empresa se concentra nos esforços de aumento de escala, ainda há muito trabalho a ser feito pela Abate e por outros laboratórios para entender o que está acontecendo durante as reações no nível atômico, especialmente na interface entre as rochas e o fluido de reação.

A pesquisa em laboratório é empolgante, mas é apenas o primeiro passo, diz o professor do MIT. O próximo é ver se isso realmente funciona fora de um ambiente controlado.

( fonte: MIT Technology Review)